27 de mar. de 2012

O homem mal


Todos no bairro sabiam que ele era bandido. Era mal visto, era mal. Tinha sangue no olho, mesmo que quase ninguém nunca o tivesse olhado nos olhos todos sabiam, todos comentavam. Era assim... frio. Dona Rosa o cumprimentava todos os dias pela manhã, mas sabia que era frio, não havia bondade em sua voz, se é que havia voz. Estava mais para uma espécie de ruído, algo como o que os animais fazem. Não porque sofresse de algum problema cognitivo ou de dicção, coisa do tipo. Mas era a impressão que dava. Não era possível distinguir as palavras ´´bom´´ ´´dia´´, soavam apenas pelo ar, não significavam, não podiam significar, havia algo que escapava à compreensão se tentasse empregar sentido.

BOM DIA - Diz o cumprimento do que tem que ser cumprido.
BOM DIA - Diz quem dá bom dia.
BOM DIA - um barulho qualquer, como TÔ FRACO ou BEM TE VÍ.

Numa tarde em que Joana, outra vizinha, voltava com seus filhos da escola caminhando pelas ruas, ele parou sua moto num cruzamento e esperou que ela e suas crianças passassem. Isto não era algo comum, os motoristas não paravam alí, mesmo havendo um sinal que indicasse a preferência para o trânsito das crianças que saiam da aula. Não o respeitavam, não havia porque respeitá-lo, pois só visava equacionar as coisas de modo que todos não tivessem que esperar muito tempo, e garantia a segurança dos pequenos, não agilizava o trânsito de automóveis, pelo contrário, o atrasava por alguns segundos.

Neste dia Joana não o achou, o bandido, tão mal assim. Ele pareceu, de algum modo, mais humano, ou os outros motoristas é que pareceram mais. Não sabia direito, estava confusa.

(Rafael Barros)