20 de jun. de 2012

Pai e Filho





 “A beleza enche os olhos d’água.”
Adélia Prado




     Hoje faz um dia lindo. De luz alaranjada, céu azul, calor intenso e ocasionais brisas refrescantes. As lágrimas que teimam em escorrer pelo meu rosto, não são de tristeza, muito pelo contrário, são de felicidade. Estou iluminado.
     Minhas costas ardem pela constante exposição ao sol, consequência do encantamento de um mineiro que visita a praia pela primeira vez na vida. Mato a sede com cerveja, consequência do espírito boêmio de alguém que prefere gastar seu pouco dinheiro com algo mais atraente do que água mineral ou água de coco. Não, não estou bêbado. Não sou, neste momento, mais um bêbado chorão, como tantos outros por aí. Choro pelo que estou vendo. Choro por nunca ter percebido o que agora percebo. Choro também, pela medíocre condição humana, que só desfruta de sentimentos iluminados como este em pequenos lapsos de tempo. Provavelmente, daqui a algumas horas, nem me lembre do que sinto agora. A bebida vai acabar, o sol vai esfriar e outras coisas sem a mesma beleza e importância chamarão a minha atenção. Voltando minha existência à mesmisse de sempre.
     A felicidade também é efêmera. É como uma droga em que todos nós já nascemos viciados. Algo pelo qual passamos o tempo todo à procura, consciente ou inconscientemente. Como um viciado em crack, que gasta todo o seu tempo e dinheiro na busca pela droga e por aqueles minutos de satisfação. Nascemos, estudamos, trabalhamos, casamos; fazemos tudo, na esperança de encontrar a felicidade, mesmo sabendo que ela é passageira, e que, quando seu efeito se for, estaremos como antes, loucos pela próxima dose.
     Sozinho nesta tarde, com os pés acariciando a areia, presencio uma cena que de tão bela, faz-me sentir indigno de assisti-la. Há dez metros de distância, no raso, onde a água do mar leva e trás a areia da praia,
um pai se diverte com seu filho. Os dois se parecem com todos os outros habitantes desta cidade litorânea. Tem a mesma aparência, o mesmo sotaque, os mesmos costumes, como se tivessem vivido aqui durante milênios. Uma cena que por si só já seria bela, um pai e um filho brincando juntos na praia, acaba sendo ainda mais bonita e significante, pois o garoto não é como a maioria dos garotos. Este garoto que me enche os olhos d’água, tem os braços e pernas paralisados. Seus movimentos são involuntários, por isso ele não pode andar. Ele está, assim como eu, encantado com o mar e o balanço das ondas, como se fosse a primeira vez que molha o corpo em águas oceânicas. O menino tem uma expressão constante de extrema felicidade. Seu pai sorri, também com lágrimas nos olhos, enquanto carrega-o no colo, agachado na areia, deixando as ondas banharem os dois. Eles brincam entre si e trocam olhares de gratidão o tempo todo. O garoto é grato por experimentar a mesma felicidade que outros meninos de sua idade experimentaram várias vezes. A felicidade de brincar com as ondas, brincar com a água do mar, o berço da vida em nosso planeta. Sentir-se pequeno e impotente, frente a toda aquela imensidão de água, mas ao mesmo tempo, sentir-se parte disso tudo. O pai parece estar grato simplesmente por seu filho existir da forma que é e estar ali com ele naquele momento. O pai, naquele momento, parece não desejar mais nada da vida. Está feliz, apenas estando ali com seu filho.
     Acendo um cigarro e tento enxugar o rosto. Em vão, pois as lágrimas continuam a escorrer. Minutos depois, o pai se levanta com o filho no colo e os dois se vão entre gargalhadas de pura felicidade. Eu, continuo sentado no mesmo lugar, paralisado de emoção. Já não sou a mesma pessoa, já não penso mais como antes. Agora sei que esta imagem me acompanhará por toda a vida. Nunca irei esquecer aqueles dois brincando na praia, na mais bela interação entre pai e filho que já presenciei. Não tento entender a felicidade que aquele garoto sentiu naquele momento. Mas sei que é um tipo de felicidade que eu e você nunca sentiremos.





(Walisson Menezes)